Semana Santa de Braga
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Semana Santa de Braga

Uma tradição anual multissecular

Apresentação


Origens

As representações comemorativas da Paixão e Morte de Jesus tiveram início na Terra Santa, no século IV, desde que, após séculos de perseguição pelo poder romano, o imperador Constantino, com o famoso Édito de Milão (313), deu a paz à Igreja. Realizavam-se nos locais e horas em que tinham decorrido os respectivos acontecimentos. A peregrina Egéria (ou Etéria), que, nos finais daquele século, se deslocou do noroeste da Ibéria (Galécia) à Palestina, no seu escrito Peregrinatio ad Loca Sancta (Peregrinação aos Lugares Santos), faz já um relato daquelas celebrações. Foram, de facto, os peregrinos que deram a conhecer a Semana Santa e estenderam ao mundo cristão o costume de a celebrar. É provável que nas terras da Península Ibérica, isso aconteça já desde tempos próximos dos séculos IV-V.

 

Por sua vez, a Quaresma – com alusão aos quarenta dias da travessia do deserto pelo povo de Israel e os quarenta dias que Jesus passou no deserto – surgiu como tempo de preparação espiritual para o baptismo que, já no século III, era costume celebrar na Vigília Pascal. Desde o século V, foi assumida também como tempo penitencial para os pecadores que haveriam de ser reconciliados com Deus e a Igreja na quinta-feira Santa.

 

A Semana Santa de Braga, de cujo início exacto se desconhecem o tempo e o modo, entronca, sem dúvida, nesta tradição multissecular e conserva o sentido original de comemoração dos mistérios da Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo, tendo sido, no decurso dos tempos, enriquecida com elementos inovadores e exclusivos. De modo semelhante, a Quaresma em Braga mantém o duplo sentido original atrás referido, tendo também ela sido enriquecida com ações celebrativas de preparação e ambientação para a Semana Santa e Páscoa que são únicas em Portugal e no mundo.

 

 

O Rito Bracarense

 

O período das origens da liturgia em Braga permanece na obscuridade. Panorama idêntico depara-se às demais Igrejas ibéricas. Parece consensual que o início da liturgia na Igreja de Braga se enquadra na problemática mais vasta das origens da liturgia hispânica, sobre a qual, porém, não há unanimidade entre os estudiosos.

 

S. Geraldo, arcebispo de Braga entre 1096 e 1108, era antigo monge de Moissac. Foi o promotor da renovação litúrgica, substituindo a antiga liturgia hispânica pela liturgia romana. Ele que, antes, tinha sido bibliotecário na abadia de Moissac, onde existia um scriptorium de alta qualidade, e, na catedral de Toledo, desempenhara os cargos de Chantre e Mestre-Escola. Segundo o seu biógrafo, ele dotou a catedral de alfaias e objetos necessários ao culto: entre eles, vêm explicitados «libros divinos», expressão que compreende, segundo interpretação de vários estudiosos, além da Bíblia, os livros litúrgicos. Sucede-lhe D. Maurício Burdino (1109-1118), provavelmente da abadia clunicense de S. Martial de Limoges, onde existia outro importante scriptorium. Também ele terá provido a catedral com livros litúrgicos.

 

Do núcleo que remonta à época de S. Geraldo, Braga organiza e enriquece lentamente a sua liturgia, com a inclusão de costumes locais antigos e a permeabilidade a influxos doutras Igrejas e das ordens religiosas. Consensual é que, já no século XIII, a Igreja bracarense tinha consciência de possuir uma tradição litúrgica própria, distinta dos usos litúrgicos das Igrejas vizinhas, que, na sua organização, foram também permeáveis a influências do mesmo género. Uma constituição de 12 de junho de 1265 estabelece normas litúrgicas para o ofício na catedral. Tais regras estão em pleno acordo com as rubricas do "Breviário de Soeiro", e com quanto se diz na "Arte de Rezar - As horas canónicas ordenadas segundo as regras e costume bracarenses", impressa em 1521. Além disso, o "Breviário de Soeiro" utiliza as leituras dum lecionário em uso na catedral de Braga em 1282. Em 1292, as Visitas de Cluny falam duma comunidade em Vimieiro, nos arredores de Braga, que recitava o ofício «secundum modum terrae». No testamento de Maior Miguéis, redigido a 2 de dezembro de 1301, aparece pela primeira vez a expressão clássica, referida a missas pelos defuntos, que deveriam ser celebradas «iuxta consuetudinem ecclesiae bracarensis».

 

O rito bracarense adquire maior estabilidade na última década do século XV, quando, depois duma provável crise, são impressos os primeiros incunábulos: breviário, em 1494; ritual, em 1496; missal, em 1498. De seguida, fizeram-se sucessivas edições, as últimas das quais no século XX, com bulas de aprovação dos Papas, que foram usadas nas paróquias da Diocese de Braga, incluindo as da atual diocese irmã de Viana do Castelo, até á data da sua criação.

 

Três são as características ou «especiais feições» do Rito Bracarense mais evocadas: duas mais recorrentes, às quais alguns acrescentam uma terceira, a saber, a acentuada devoção eucarística, o desenvolvido cariz mariano e a dileção pelo Espírito Santo, respetivamente.

 

Atualmente, desta tradição consuetudinária, só uma parte continua a celebrar-se na liturgia e em certos momentos: nomeadamente, durante o Domingo de Ramos, da qual se destaca a Bênção e Procissão dos Ramos desde a igreja de S. Paulo do Seminário Conciliar até à porta da catedral, cuja entrada se faz com rito próprio; a Procissão da Burrinha, na quarta-feira Santa; e, no Tríduo Pascal, certos ritos que se fazem com variações em relação ao Rito Romano: o lava-pés, a adoração da cruz, a inclusão do dragão em certas procissões interiores da Sé, etc. No género das procissões, algumas têm características próprias, desde logo, as procissões que seguem itinerários pelas ruas da cidade: a Procissão de Nossa Senhora da ‘burrinha’, na quarta-feira Santa; Procissão do Senhor Ecce Homo, na quinta-feira Santa; Procissão do Enterro do Senhor, na sexta-feira Santa. Outras procissões, também características, mas do domínio litúrgico, são: Procissão Teofórica do Enterro, na celebração da Paixão do Senhor; e Procissão da Ressurreição, na vigília pascal, ambas no interior da catedral.

 

 

Breve descrição dos diferentes eventos e cerimónias que ocorrem no decurso da Semana Santa de Braga:

 

Sábado antes do domingo de Ramos

 

As celebrações começam na noite de sábado antes do domingo de Ramos, com a Procissão da Trasladação do andor do Senhor dos Passos, da igreja de Santa Cruz para a igreja do Seminário (ou de S. Paulo). Segue-se a Via Sacra, que percorre uma série de estações ou "calvários".

 

Domingo de Ramos

A manhã é ocupada com a Bênção dos Ramos na igreja do Seminário, seguida da Procissão dos Ramos em direção à Catedral, em cuja galilé se ritualiza a entrada de Jesus em Jerusalém (segundo o antigo costume do Rito Bracarense), com o diálogo entre Jesus e os guardiões da cidade, a cujas três batidas na porta, com a cruz, são sensíveis e abrem os pórticos antigos. Às 11h, é celebrada a solene Missa do domingo de Ramos. A meio da tarde, sai da Igreja do Seminário a grandiosa Procissão dos Passos. No meio do percurso, junto à igreja de Santa Cruz, acontece o comovente encontro de Jesus com sua Mãe, ilustrado pelo Sermão do Encontro.

 

Segunda-feira Santa e terça-feira Santa

Na segunda e na terça-feira santas têm lugar, à noite, os dois últimos grandes concertos (de um vasto programa cultural) de música sacra, coral sinfónica.

 

Quarta-feira Santa

À noite, tem lugar o cortejo bíblico “Vós sereis o Meu povo”, popularmente conhecido como “Procissão de Nossa Senhora da «burrinha»”.

 

Quinta-feira Santa

De manhã, acontece a solene celebração da Missa Crismal e Benção dos Santos Óleos e, de tarde, a tem lugar a cerimónia do Lava-Pés e a Missa da Ceia do Senhor. As duas têm lugar na Catedral. À noite, sai à rua a grandiosa Procissão do Senhor Ecce Homo ou dos Fogaréus.

 

Sexta-feira Santa

Na catedral, logo pela manhã, canta-se o ofício de Laudes, seguido de serviço de confissões. Às 15:00 horas em ponto tem início, na Catedral, a comovente celebração da Morte do Senhor. No decorrer desta, realiza-se uma das ações exclusivas do costume litúrgico bracarense (o apelidado Rito Bracarense"), a Procissão Teofórica, pelas naves da Catedral que constitui um dos momentos mais emocionantes de toda a Semana Santa. À noite, é a vez da mais solene de todas as procissões pelas ruas da Cidade, a Procissão do Enterro do Senhor. Cerca de 100.000 espetadores assistem ao desfilar desta procissão.

 

Sábado 

Antes da Páscoa tem a manhã ocupada de modo semelhante à sexta-feira. À noite, na Catedral, tem lugar a soleníssima Vigília Pascal, que encerra com a triunfal Procissão da Ressurreição.

 

Domingo de Páscoa 

O Arcebispo preside, na Catedral, à solene Missa do Domingo de Páscoa. Ao longo do dia, pelas ruas da Cidade, procede-se à jubilosa Visita Pascal e bênção das casas.